27 de agosto de 2012

Que boas, as novelas do Plim Plim! (Parte 1)

Fizeram um remake da "Gabriela", uma novela de grande sucesso da Rede Globo e a primeira a ser exportada e vista pelo público português. Trazia uma linguagem nova a um país vergado pelo Estado Novo. A personagem principal era jovem e transbordava sensualidade. Dizem que foi um sucesso estrondoso em Portugal. Dizem que parou o país.

Nessa época, eu ainda não tinha vindo ao mundo, mas desde que me conheço por gente que me recordo de ver as telenovelas brasileiras da Rede Globo. A estação do "Plim Plim" tinha os melhores autores, os melhores actores e os maiores recursos técnicos da teledramaturgia brasileira, o que se traduzia em fenomenais recordes de audiências.

A RTP começou a transmitir as novelas da estação do "Plim Plim" e a vida de milhares de portugas nunca mais foi a mesma (incluindo a minha!)

Roque Santeiro (1985)


Autoria: Dias Gomes 
Co-autoria: Aguinaldo Silva 
Colaboração: Marcílio Moraes e Joaquim Assis 
Direção: Paulo Ubiratan, Jayme Monjardim, Gonzaga Blota e Marcos Paulo 
Direção geral: Paulo Ubiratan 

A minha primeira recordação de uma novela brasileira da Rede Globo foi a personagem Sinhozinho Malta (Lima Duarte) e o seu famoso chocalhar de pulseiras, enquanto dizia: “Tô certo ou tô errado?”
Mais memórias não tenho, mas descobri muitos anos depois, que se baseava numa obra de Dias Gomes, intitulada O Berço do Herói. A novela era uma poderosa sátira política e social (censurada pela ditadura militar) e, para muitos críticos de televisão e noveleiros convictos, a obra-prima da teledramaturgia brasileira de qualquer estação.

Com aquela novela, inaugurou-se uma 'receita' de sucesso: uma mistura inteligente de sátira social, numa cidadezinha do interior que serve como um microcosmos do Brasil, apimentada com a comédia de personagens caricatas e o uso q.b. do realismo mágico. Aguinaldo Silva escreveu outras novelas de grande sucesso com esta mesma 'receita'.

Na minha memória de criança, ficou o Sinhozinho Malta e o imenso fascínio pelas interpretações do Lima Duarte.

Tieta (1989)


Autoria: Aguinaldo Silva, Ana Maria Moretzsohn e Ricardo Linhares 
Direção: Reynaldo Boury e Luiz Fernando Carvalho 
Direção geral: Paulo Ubiratan 

Ai, a Tieta!... Ainda me lembro da crueldade do seu pai, o Zé Esteves (Sebastião Vasconcellos) quando espulsou a filha Tieta (Claudia Ohana/Betty Faria) da cidade de Santana do Agreste. A "cabrita" prometeu vingança e, após muitos anos fora, voltou rica e pronta para fazer justiça. Lembro-me dos permanentes confrontos dela com a sua irmã Pertpétua (Joana Fomm). A irmã mais velha malvada era a viúva do major, vestia-se sempre de preto, andava com um guarda-chuva para todo o lado e era uma beata muito pecadora. Foi ela que denunciou a irmã caçula para o pai e fez com que ela fosse espulsa da cidade. A Joana Fomm fez um papelão de bater palmas de pé e, até hoje, o seu sotaque peculiar não me saiu da memória. Também a personagem da Dona Milu (Míriam Pires) me ficou na memória pelo seu inesquecível bordão: quando algo de estranho acontecia, ela dizia "Mistéééério..." E a caixinha da Perpétua, o que será que continha? E quem era a "mulher de branco", que atacava os homens da cidade? Lembro-me da 'assombração', mas não da sua identidade... 

Inspirada pela obra de Jorge Amado, a personagem de Tieta era a metáfora do autor Aguinaldo Silva para o regresso da liberdade de expressão, com o fim da ditadura militar. O realismo mágico volta com o fim da novela, quando uma tempestade de areia 'engole' Santana do Agreste para sempre. A Perpétua desaparece quando o seu finado marido a vem buscar.



Rainha da Sucata (1990)


Autoria: Silvio de Abreu 
Escrita por: Silvio de Abreu, Alcides Nogueira e José Antonio de Souza 
Direção: Jorge Fernando e Jodele Larcher 
Direção geral: Jorge Fernando 

A abertura desta novela era genial com a interacção da dançarina de lambada feita de lata com os seus homólogos de carne e osso. Sempre achei aquela lambada da abertura algo incrível. Como é que eles conseguiam fazer aquela boneca parecer viva e dançar?! Mais!, a vénia que ela fazia no final, depois de rodopiar sobre si mesma... Era algo de génio! Mas a maior pérola desta novela era, sem dúvida, a actuação de Aracy Balabanian no papel de Dona Armênia e os seus constantes confrontos entre ela e a sua vizinha Maria do Carmo (Regina Duarte). A Dona Armênia era dona do terreno onde Maria do Carmo tinha o seu negócio e ela ameaçava-a constantemente, dizendo algo como "Eu quero botar a prédio na chon!" "Tudo na chon!" A personagem da Dona Armênia tinha um visual extravagante, um sotaque carregado e hilariante e uma atitude super-protectora em relação aos seus "três filhinha". Outra imagem que me impressionou bastante foi um dos últimos momentos da novela, quando a inescrupulosa Laurinha (Glória Menezes) se suicida, atirando-se de frente de um prédio.

Esta novela de Silvio de Abreu era um espelho do que estava a pasar no Brasil naquela altura, a nível comercial; o dinheiro estava a mudar de mãos e a personagem de Maria do Carmo é a representante dessa mudança.

Vamp (1991)


Autoria: Antonio Calmon 
Colaboração: Vinícius Vianna, Lilian Garcia e Tiago Santiago 
Direção: Jorge Fernando, Fabio Sabag e Carlos Manga Jr. 
Direção geral: Jorge Fernando 

Esta não foi uma novela de horário nobre, nem no Brasil, nem em Portugal, mas fez um sucesso estrondoso como novela das sete. Por cá, passou na RTP 2, às seis da tarde. Alguém devia achar que esta novela era de quinta categoria... Na verdade, a história escrita por Antonio Calmon foi um marco na Globo, atraindo o público adolescente com o seu humor. Aquilo é que eram vampiros, não o que nos querem vender agora! A caracterização era tecnologia de ponta – se bem que hoje pareça extremamente primitiva –, mas seguir as histórias de todos aqueles vampiros dentuços de Armação dos Anjos era muito divertido! Lembro-me de rir a bandeiras despregadas com a família Matoso, especialmente a Mary (Patrícia Travassos) e o Matoso (Otávio Augusto) (que só tinha um dentão!). Quando o poderoso chefão Vlad (Ney Latorraca) perdia a paciência com eles, distribuía estaladas e murros à distância.

O Vlad era um vampiro poderoso e impiedoso... que chuchava no dedo para adormecer!

Há um discurso da Carmem Maura, (Joana Fomm) que ela faz enquanto escreve a sua monografia. Lembro-me de todas as palavras como se estivesse a ouvi-las:

"Eugênia e Rocha, como Romeu e Julieta, morreram no mesmo dia, um ao lado do outro. Rocha, cruelmente assassinado pelo demónio em forma de cão. Eugênia, por suas prórias mãos, ao perceber que seu amor por Rocha era agora impossível, tomou uma drástica atitude e foi juntar-se ao seu amante no além-vida. Os dois foram enterrados juntos. As tumbas, uma ao lado da outra, no antigo mausoléu dos Queirós,  no cemitério de Armação dos Anjos. Lá ficaram mais de 200 anos, esperando o momento de se levantarem novamente e cumprirem o destino que lhes estava reservado. Foi então que Filipe Rocha tornou-se o bravo Capitão Rocha  defensor das causas ecológicas. E Eugênia Queirós transformou-se na famosa cantora vamp  ídolo internacional do Rock n' Roll."

O Capitão Jonas (Reginaldo Faria– que tinha seis filhos – casou-se com Carmem Maura (Joana Fomm) – que também tinha seis filhos – e Natasha (Claudia Ohana), que vendera a sua alma a Vlad (Ney Latorraca) para atingir o estrelato, namorava um dos filhos do capitão, o Lipe (Fábio Assunção).

Os dois têm de se unir, se quiserem destruir o Vlad e, assim, fica montado o cenário perfeito da eterna batalha entre o Bem e o Mal ao nével cósmico, com direito a anjos do Bem, possessões benévolas, lanças, balas de prata e água benta, para atirar aos vampiros dentuços. Tudo isto, num metafórico tabuleiro de xadrez, no qual Vlad e Sig (João Rebello), o filho mais inteligente de Carmem Maura.

Mas só havia um objecto capaz de destruir o Vlad (pelo menos, na teoria): a cruz de São Sebastião...



Pedra Sobre Pedra (1992)



Autoria: Aguinaldo Silva, Ana Maria Moretzsohn e Ricardo Linhares 
Colaboração: Marcia Prates e Flávio de Campos Direção: Paulo Ubiratan, Gonzaga Blota, Carlos Magalhães e Luiz Fernando Carvalho Direção geral: Paulo Ubiratan


De todas as telenovelas que já vi, esta é a que gosto mais. Gosto de todos os núcleos do elenco, de muitas personagens e da banda sonora. O texto é excelente e as interpretações são cativantes, algumas até magistrais, tanto dos actores veteranos como dos novatos. Foi uma novela co-produzida pela RTP e que contou com dois actores lusos: Carlos Daniel e Suzana Borges, que interpretavam os dois irmãos Ernesto e Inês. Por sua conta, algumas gravações foram feitas em Lisboa. No Brasil as gravações da Chapada Diamantina, no estado da Bahia, são deveras impressionantes pela sua extraordinária beleza.

Foi por conta de uma "nostalgia aguda" por esta novela que me surgiu a ideia de escrever sobre teledramaturgia brasileira. Sim, porque há muito tempo que a RTP não passa esta telenovela, coisa que a nossa estação de serviço público teve a boa ideia de fazer algumas vezes no passado. Sobre esta novela, eu podia escrever um ensaio, mas isso ficará para outro post.

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