17 de setembro de 2012

Até a Caminha cita Cervantes!

Sempre ouvi dizer aos mais cultos que telenovela era produto de fraca qualidade, feito por gente burra para gente ainda mais burra. As palavras podem não ser exactamente estas, mas já ouvi vezes suficientes pessoas a denegrirem o género.

Lá por ter visto muitas telenovelas na minha infância, não me sinto na obrigação de as defender, mas acho a generalização snob e sem sentido, o que me traz arrepios.

Defendo a liberdade de cada um usufruir do tipo de entretenimento que mais gosta, sem culpa nem vergonha. Acredito que todos os veículos – dos mais metafóricos aos mais simplistas – são meios de aprendizagem legítimos.

Várias obras literárias foram adaptadas para televisão, entre elas a "Gabriela" e a "Tieta" de Jorge Amado e o "Roque Santeiro" de Dias Gomes.

A actual "Avenida Brasil", embora não sendo ela mesma uma adaptação literária, está embebida em valores literários e pode ser vista como uma metáfora da abertura de espírito de personagens que não têm contacto habitual com a literatura.

Veja-se a personagem de Murilo Benício  um exemplo perfeito, uma metáfora do indivíduo pouco sofisticado que desenvolve o gosto pela leitura, após lhe ser dado um grande clássico da literatura mundial. 

Os livros que Nina (Débora Falabella) recomenda a Tufão (Murilo Benício) são, na verdade, mensagens subliminares (que lhe passam completamente despercebidas) para ele ver a realidade da sua vida; mas têm um efeito colateral interessante  a ex-estrela do futebol começa a interessar-se por livros.


O Tufão já leu:

A Metamorfose de Kafka;
Madame Bovary de Gustave Flaubert;
A Interpretação dos Sonhos de Freud;
Dom Casmurro de Machado de Assis;
O Primo Basílio de Eça de Queirós 


Quem já leu as ditas obras, certamente sorrirá com a ironia das escolhas e com a mensagem que Nina tenta desesperadamente passar ao seu patrão sobre a sua vida e sobre a sua esposa.

Pelo andar da carruagem – se eu pudesse dar a minha sugestão – emprestaria ao Tufão o Ensaio sobre a Cegueira de José Saramago.

Numa telenovela contagiada (no bom sentido) pela cultura e pela literatura, até a Carminha cita Cervantes. Não acreditam?



Ou muito me engano, ou a Carminha tropeçou no Dom Quixote!


Um grande bem-haja ao autor João Emanuel Carneiro por não estupidificar o género. :)

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